PROPOSTA PEDAGÓGICA

Esta proposta está organizada em seis momentos, apresentados a seguir, elaborados para dar conta de três objetivos fundamentais:

  1. Contribuir para promover a educação das relações étnico-raciais no ensino de Ciências (VERRANGIA; SILVA, 2010)*. Para alcançar este objetivo, propomos um exame crítico da racialização da Doença Falciforme ao longo da história; a conexão da racialização da doença com as teorias raciais que fundamentaram o racismo científico; a abordagem da polissemia do conceito de raça na história da ciência, especialmente considerando a importância de uma abordagem política do conceito para se compreender e combater iniquidades raciais em saúde; e a análise de explicações evolutivas, sociais e políticas sobre a maior prevalência da doença em populações negras no Brasil;
  2. Contribuir para a educação em saúde de uma perspectiva socioecológica (MARTINS; SANTOS; EL-HANI, 2012)**. Nessa perspectiva, a saúde é compreendida não apenas a partir de aspectos biológicos mas, também, tendo em vista múltiplos aspectos que influenciam a saúde individual e coletiva, como aspectos sociais, políticos, ambientais e históricos  Nesse sentido, contrapomos discursos estigmatizantes associados a racialização da Doença Falciforme, encontrados na biomedicina e na educação, com discursos que problematizam, questionam e confrontam os estigmas e propõem outras formas de se compreender e se falar sobre a Doença Falciforme nas esferas biomédica e educacional.
  3. Possibilitar uma abordagem crítica equilibrada da ciência (SÁNCHEZ ARTEAGA; EL-HANI, 2012)***. Para este objetivo, buscamos abordar tanto os problemas, limites e más consequências de discursos e práticas científicos, como também o seu alcance, contribuições e benefícios ao longo das atividades propostas nesse MCE. Deste modo, buscamos superar posturas polarizadas e simplistas em relação à ciência, que conduzem, de um lado, a posturas cientificistas que consideram que o desenvolvimento científico sempre produz resultados positivos; ou, de outro lado, a posturas de desconfiança, de negação e de aversão à ciência que consideram que o desenvolvimento tecnocientífico sempre resulta em consequências negativas para a sociedade e o ambiente

*VERRANGIA, Douglas; SILVA, Petronilha B. G. Cidadania, relações étnico-raciais e educação: desafios e potencialidades do ensino de Ciências. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 36, n.3, p. 705-718, 2010. 

**MARTINS, Liziane; SANTOS, Girlene. S.; EL-HANI, Charbel. N. Abordagens de saúde em um livro didático de biologia largamente utilizado no ensino médio brasileiro. Investigações em Ensino de Ciências, v. 17, n. 1, p. 249-283, 2012. 

***SÁNCHEZ ARTEAGA, Juan M.; EL-HANI, Charbel N. Othering Processes and STS Curricula: From Nineteenth Century Scientific Discourse on Interracial Competition and Racial Extinction to Othering in Biomedical Technosciences. Science & Education, v. 21, n. 5, p. 607-629, 2012.

ATIVIDADES

MOMENTO 1: Breve Panorama sobre as Implicações Sociais do Pensamento Darwinista

Debate sobre o racismo na sociedade brasileira contemporânea e suas possíveis raízes. Discussão sobre a importância de se considerar as relações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente (CTSA) para a compreensão da história do racismo científico. Abordagem de discursos e as práticas implicadas com o pensamento darwinista que levaram, em alguns casos, a processos históricos de alterização – hierarquização, segregação e privação de benefícios para grupos humanos rotulados como “outros” por categorias como raça, sexo e gênero -, como e em especial, o racismo científico. De modo equilibrado, apresentam-se situações em que o darwinismo contribuiu para a solução de problemas sociocientíficos contemporâneos, como o caso da compreensão do problema da obesidade, da resistência de bactérias a antibióticos, o uso de análise filogenética para investigar o caminho evolutivo e epidemiológico de agentes etiológicos de doenças, como vírus, e sua relação com hospedeiros. 

Para a contextualização do racismo científico no século XIX e XX, pode ser recomendado para as/os estudantes o documentário “Racismo: uma história”, Parte 2 – Colonialismo e Extermínio, da rede de televisão inglesa BBC.   Para tratar das alterizações de raça e gênero. 

MOMENTO 2: Conceito de Competição Inter-racial e Extinção Racial na Espécie Humana / Ideologia do Branqueamento no Brasil

Abordagem sobre o contexto de surgimento dos conceitos de competição inter-racial e extinção racial, e da ideologia do branqueamento no contexto brasileiro e suas relações com questões raciais atuais. Leitura da Comunicação de João Baptista de Lacerda “Sobre os mestiços no Brasil”, apresentada no Primeiro Congresso Universal das Raças, em 1911 (ver em recursos), seguida de atividade em grupo para discussão (ROTEIRO – A).  Na contextualização histórica, além das ideias de cientistas e intelectuais, podem ser analisadas obras de arte que ilustram o pensamento racial e a ideologia do branqueamento no Brasil do século XIX e início do século XX (ver recursos). 

No final deste momento da sequência didática, as/os estudantes são orientadas/os sobre como desenvolver uma proposta de ação sociopolítica de natureza educativa (ver na aba Orientações Pedagógicas/ Currículo e Ensino). Ao longo dos momentos seguintes da sequência didática, as/os estudantes desenvolvem extraclasse uma proposta dessa natureza com informações gerais a respeito da Doença Falciforme e relacionada a racialização da doença para ser apresentada no ultimo momento sequência didática.

MOMENTO 3: Polissemia do Conceito de Raça e Implicações para a Educação das Relações Étnico-raciais no Ensino de Ciências

Leitura de dois textos disponibilizados no blog Darwinianas sobre o conceito de raça na Ciência (ver em recursos) e debate com base em questões (ROTEIRO – B). Discussão sobre a polissemia do conceito de raça na história da ciência, a partir da problematização do conceito biológico de raça, da sua origem a sua desconstrução pela genética moderna, a ressignificação do conceito como categoria social e política, e as consequências para as relações étnico-raciais no Brasil (a partir da apresentação de índices de desigualdade étnico-sociais). 

MOMENTO 4: Racialização da Doença Falciforme

Leitura do Texto 1 (disponível na aba Fundamentos). Abordagem sobre a origem do discurso de racialização da Doença Falciforme e as consequências desse discurso, tanto no passado como na contemporaneidade; as explicações evolutivas para a manutenção do alelo S em populações de diferentes regiões geográficas em que ocorre a malária (com auxílio do ROTEIRO – C); aspectos históricos, socioeconômicos e raciais relacionados à assistência às pessoas com Doença Falciforme e o reconhecimento de grupos vulneráveis; contraposição dos discursos estigmatizantes sobre a Doença Falciforme com discursos superadores de estereótipos e preconceitos na biomedicina e na educação. Atividade em grupo em que estudantes devem examinar criticamente a abordagem em saúde da anemia falciforme em textos e imagens retirados de livros didáticos de Biologia do Ensino Médio, a partir de roteiro (ROTEIRO – D). Trata-se de analisarem questões como: (1) qual a abordagem dada à doença – são explorados aspectos históricos, sociais e políticos de sua epidemiologia e assistência e cuidado à população acometida?; (2) reproduz discursos que racializam a doença e/ou estigmatizam as pessoas que a apresentam?; (3) Por meio de qual abordagem da saúde é apresentada a doença? Como exemplo e parâmetro de uma abordagem socioecológica da educação em saúde, pode-se apresentar aos estudantes a cartilha “Doença Falciforme: o papel da escola” (ver recurso).

MOMENTO 5: Aconselhamento genético: risco de uma nova eugenia?

Abordagem dos princípios éticos do aconselhamento genético; da relação entre aconselhamento genético e eugenia no passado; e dos riscos do aconselhamento genético dirigido às pessoas diagnosticadas com a Doença Falciforme ou com o traço falciforme trazer à tona novas formas de eugenia (vide Texto 1 da aba Fundamentos). Leitura do trecho retirado de um artigo que relata um caso de aconselhamento genético para pessoas com o traço falciforme detectados em exame pré-doação, em um hemocentro do Distrito Federal, seguido de debate a partir de questões lançadas pela professora (ROTEIRO – E).

MOMENTO 6: Apresentação de Propostas de Ação Sociopolítica sobre a Doença Falciforme.

Nesse momento, as/os estudantes apresentam a proposta de ação sociopolítica que construíram com base nos debates das atividades anteriores, com informações gerais a respeito da Doença Falciforme e, também, problematizando a racialização da doença.

RECURSOS

Momento 1: Documentário “Racismo: uma história”, Parte 2 – Colonialismo e Extermínio, da BBC.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NB4qwWdNbWY&t=962s

Momento 2: Comunicação “Sobre os Mestiços no Brasil” e obras para análise.

A comunicação João Baptista de Lacerda “Sobre os mestiços no Brasil” pode ser encontrada no final do artigo – SCHWARCZ, Lilia M. Previsões são sempre traiçoeiras: João Baptista de Lacerda e seu Brasil branco. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, v.18, n.1, p.225-242, jan.-mar. 2011. Este artigo pode ajudar na fundamentação teórica desta aula. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/hcsm/v18n1/13.pdf

As obras “A Redenção de Cam”, de Modesto Brocos y Gomes, de 1895, e “Um Jantar Brasileiro”, de Jean Baptiste Debret, de 1827, podem ser usadas na atividade de análise de obras de arte e são encontradas em busca na internet.

Momento 3: Textos sobre conceito de raça na Biologia.

São utilizados os textos de divulgação científica escritos pelo geneticista Diogo Meyer (IB-USP) publicados e disponibilizados no Blog Darwinianas: 

“Existem raças humanas?” (https://darwinianas.com/2017/01/17/existem-racas-humanas/)

 “Vamos conversar sobre raça?” ( https://darwinianas.com/2017/10/03/vamos-conversar-sobre-raca/)

Para fundamentar-se para a discussão sobre a polissemia do conceito de raça, veja o Texto 2 da aba de Fundamentos: “O desafio de falar sobre o conceito de raça em sala de aula de Biologia”.

Para suscitar o debate sobre relações étnico-raciais desiguais no Brasil, podem ser utilizados dois banners disponíveis no acervo da Exposição Ciência, Raça e Literatura, referentes a Charge de Laerte “A ciência já provou a inexistência de raças humanas. Mas continua um mistério: A estranha tendência das armas de fogo de atingirem jovens negros” (Folha, 21/05/2011) e as “ Faces da Desigualdade”.  Em relação aos dados do segundo banner, as/os professoras/es podem utilizar dados atualizados retirados de censos do IBGE ou relatórios e dossiês organizados por movimentos sociais.

Momento 4: Cartilha “Doença Falciforme: o papel da escola”.

Para fundamentar-se para a discussão sobre a racialização da Doença Falciforme, veja o Texto 1 da Aba de Fundamentos: “Doença falciforme: uma doença racial?”.

A Cartilha “Doença Falciforme: o papel da escola” foi desenvolvida em parceria pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano e pela Secretaria de Educação do Estado da Bahia (BAHIA, 2017). Disponível em: https://www.ufrb.edu.br/portal/images/documentos/2018/cartilha_doenca_falciforme.pdf

Momento 5: Artigo sobre o processo de aconselhamento genético em um centro de doação de sangue do Distrito Federal

DINIZ, D.; GUEDES, C. Confidencialidade, aconselhamento genético e saúde pública: um estudo de caso sobre traço falciforme. Caderno Saúde Pública, v. 21, n. 3, p. 747-755, maio/jun. 2005. Disponível em: https://www.ufrb.edu.br/portal/images/documentos/2018/cartilha_doenca_falciforme.pdf

 

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