Materiais Curriculares Educativos
PROPOSTA PEDAGÓGICA
Objetivos de aprendizagem:
- Compreender os conceitos de herança, variabilidade, genótipo e fenótipo, ancestralidade;
- Compreender que a cor da pele é um caráter resultante de herança quantitativa ou poligênica, caracterizada pelo efeito aditivo dos alelos;
- Desenvolver uma visão crítica da etnosemântica utilizada nos livros didáticos para categorização da variabilidade genética humana nas categorias preto, mulato escuro, mulato claro e branco;
- Compreender o papel que a Biologia desempenhou no desenvolvimento do conceito de raça e suas implicações políticas e sociais;
- Distinguir o conceito de raça biológica e raça como construto social; Compreender a noção de reparo social que fundamenta a política de ações afirmativas no Brasil;
- Desenvolver uma visão crítica do uso e veiculação de conhecimentos da genética a respeito da variabilidade humana no debate sobre cotas raciais nas universidades brasileiras.
Conteúdos
- Conceituais: raça biológica e raça como construto social; genótipo e fenótipo, herança, variabilidade intrapopulacional; Formação do povo brasileiro e exclusão social; direito e acesso aos bens sociais; direitos humanos e direitos sociais;
- Procedimentais: argumentação; análise crítica de discursos científicos sobre raça e relações étnico-raciais; exame de vínculos ideológicos e políticos que permeiam diferentes usos do conceito de raça; busca de informações sobre trajetória de ativistas do movimento negro e protagonismo de diferentes grupos étnico-raciais na luta por direitos humanos e sociais;
- Atitudinais: Reconhecimento do caráter racial presente nas desigualdades sociais; exame ético dos argumentos veiculados no debate sobre sistema de cotas na universidade pública; desenvolver empatia com minorias sociais, políticas e econômicas e respeito às identidades desses coletivos, e aos seus processos e formas de resistência e luta; Empoderamento e protagonismo juvenil em prol da defesa de direitos conquistados; identidade e pertencimento étnico-racial positivo.
A proposta encontra-se organizada em cinco momentos, os quais foram organizados de modo a dar conta de quatro elementos considerados fundamentais para uma educação em direitos humanos por Candau e colaboradores (2013)*:
- Visão integral dos direitos humanos: implica em promover a compreensão dos direitos em sua globalidade, sem reduzi-los aos direitos individuais e civis, sabendo articular direitos individuais aos coletivos; e direitos deigualdade com as da diferença;
- Formação do sujeito de direito: pressupõe desconstruir a mentalidade de ver o direito como um favor, e promover a compreensão de que leis, declarações, políticas públicas voltadas a garantia de direitos humanos são fruto de lutas históricas de grupos sociais que sofreram ou sofrem privações de direitos e lutam para libertar-se de processos de opressão;
- Educação para “nunca mais”: supõe manter viva a memória de eventos de violação de direitos humanos e dos horrores gerados por colonizações, ditaduras, autoritarismos, perseguições políticas, torturas, escravidões, genocídios. De modo a quebrar a “cultura do silêncio” e da invisibilidade e da impunidade, e gerar energias de coragem, justiça, e compromisso que favoreçam a construção e exercício da cidadania;
- Empoderamento individual e coletivo: volta-se a potencializar pessoas e grupos que historicamente têm sido marginalizados, excluídos, silenciados cotidianamente
* CANDAU, V; PAULO, I; ANDRADE, M.; LUCINDA, M. da C.; SCAVANI, S.; AMORIM, V. Educação em Direitos Humanos e formação de professores(as). São Paulo: Cortez, 2013. 232p.
MOMENTO 1: Mobilização para o exame do debate sobre cotas
Apresentação do debate social sobre implementação de cotas raciais nas universidades públicas brasileiras, a partir da qual, são examinados a os argumentos favoráveis e contrários às cotas, chamando atenção para os diferentes significados atribuídos à raça e para o conhecimento da genética utilizado. Pode ser realizada a partir de trechos do documentário “Raça Humana” que retrata a experiência da implementação das cotas raciais na UnB.
MOMENTO 2: Entendendo a relação entre Ciência e Raça
Leitura e discussão de texto sobre desenvolvimento histórico do conceito de raça nas ciências naturais e aula expositiva sobre Herança da cor da pele. A ênfase dada a discussão do texto é a análise do uso do conceito de raça pelas ciências biológicas como ferramenta para descrever variabilidade humana e sua relação com o racismo e as políticas afirmativas.
MOMENTO3: Raça como fenômeno social
Discussão das implicações sociais do discurso da genética contemporânea sobre inexistência de raça no contexto de desigualdades étnico-sociais e políticas afirmativas. A proposta é que problematizemos o conceito biológico e o conceito social de raça, a partir da apresentação de índices de desigualdade étnico-sociais – acesso à educação, salários, cargos públicos de liderança vs morte por armas de fogo, violência obstétrica, por exemplo.
Na nossa experiência, iniciamos a partir da exposição de uma charge que problematiza a desconstrução do conceito de raça pela genética contemporânea frente a criminalização e violência policial contra jovens negros (ver recursos). É recomendável também usar algum recurso como um vídeo ou reportagem escrita sobre audiências públicas com familiares de jovens negros vítimas de uma violência policial para mobilizar a memória de episódios de violação de direitos humanos e reconhecê-los como resultado de racismo e criminalização do negro. Dessa forma, é possível promover a “educação para nunca mais” e desenvolver o sentimento de empatia necessário ao exercício de julgamento do que é justo e uma argumentação dialógica no exame do debate de cotas. Na nossa experiência, usamos o caso da “Chacina do Cabula”: o assassinato de 14 jovens negros entre 16 e 27 anos em 5 de fevereiro de 2015, em um bairro popular de Salvador (BA), Vila Moisés, em decorrência de uma ação da Ronda Especial Polícia Militar da Bahia (Rondesp), em uma ação que apresentou caraterísticas de “execução sumária” segundo a acusação do Ministério Público (https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2019/02/06/chacina-do-cabula-acao-da-pm-que-deixou-12-mortos-na-ba-segue-sem-solucao-apos-4-anos.ghtml ).
MOMENTO 4: Cotas: privilégio ou direito conquistado?
Apresentação da história do ativismo negro que resultou na conquista das cotas, e o significado do ingresso de cotistas nas universidades públicas para empoderamento desse grupo étnico-racial. Pode ser feito a partir da apresentação dos resultados de uma pesquisa solicitada anteriormente – por exemplo, na segunda ou terceira aula – aos estudantes a respeito da trajetória de ativistas do movimento Negro no Brasil, a exemplo de Abdias do Nascimento e de estudantes cotistas, a exemplo da estudante de medicina Suzane da Silva, bolsista do ProUni. A abordagem dada essa atividade deve ser dirigida à promoção em estudantes negros e negras de auto-estima e pertença étnico-racial positiva, e a compreensão entre todos de que as cotas não são uma concessão do Estado, mas uma conquista social do movimento negro (formação de sujeito de direito).
Ao final, apresentação do caso por meio do qual os estudantes devem examinar a questão sociocientífica (QSC), que faz referência aos critérios elegíveis para candidatos a cotas raciais no ensino superior (ver recursos), para que os alunos se preparem em casa para a discussão na aula seguinte, por meio das questões orientadoras (ver recurso).
MOMENTO 5: Examinando o debate de cotas como uma questão sociocientífica
Discussão coletiva das questões orientadoras (ver recursos) e da tomada de decisão dos alunos acerca do caso (ver recursos). Este momento tem como objetivos: discutir a validade do sistema de cotas para negros nas universidades, apesar da negação da existência de raças humanas a partir de estudos genéticos; Conscientizar os estudantes do direito que muitos possuem de solicitar uma vaga na universidade pelo sistema de cotas; e problematizar a visão de que os candidatos a cotas raciais reclamam apenas o direito de acesso ao ensino superior, examinando o significado que essa decisão e atitude têm para a expectativa, principalmente do Movimento Negro, de que a sociedade brasileira experimente índices de igualdade racial e social (formação do sujeito de direito). Para tanto, os alunos são convidados a expor as impressões sobre o caso, bem como sobre a política de cotas e como se posicionariam frente às questões propostas.
Recursos
Momento 1: Documentário “Raça Humana”:
vencedor da categoria Documentário, na 32ª edição do Prêmio Vladimir Herzog de Anisitia e Direitos Humanos, em 2010. Tem direção e roteiro de Dulce Queiroz, e duração de 42 minutos. Encontra-se disponibilizado por meio de canal no youtube (https://youtu.be/y_dbLLBPXLo)
Momento 2: Textos sobre conceito de Raça na Biologia:
Podem ser utilizados os textos de divulgação científica escritos pelo geneticista Diogo Meyer (IB-USP) publicados e disponibilizados no Blog Darwinianas:
“Existem raças humanas?” (https://darwinianas.com/2017/01/17/existem-racas-humanas/
“Vamos conversar sobre raça?” ( https://darwinianas.com/2017/10/03/vamos-conversar-sobre-raca/)
Para fundamentar-se e desenvolver seu próprio recurso veja o texto 2 da aba de fundamentos “O desafio de falar sobre o conceito de raça em sala de aula de Biologia”
Momento 3: Utilizamos dois banners disponíveis no acervo da Exposição Ciência, Raça e Literautura, referentes a Charge de Laerte “A ciência já provou a inexistência de raças humanas. Mas continua um mistério: A estranha tendência das armas de fogo de atingirem jovens negros” (Folha, 21/05/2011) e as “ Faces da Desigualdade”. A respeito do segundo, os professores podem criar seu próprio recurso com dados atualizados retirados de censos do IBGE ou relatórios e dossiês organizados por movimentos sociais.
Momento 4 e 5: Caso “Ingresso na universidade pelo sistema de cotas raciais” e questões orientadoras
Universidade Estadual de Feira de Santana
Avenida Transnordestina, s/n – Novo Horizonte
CEP 44036-900 – Feira de Santana – Bahia